– Estela, não estou a entender o que desejas, – disse Maria.
– Ah, não é nada de especial, – respondeu Estêvão. – Só quero estar sozinho por um tempo, descansar. Vai lá ao campo, relaxa, perde uns quilinhos. Estás um pouco fora de forma.
Ele lançou um olhar desaprovador para a figura da esposa. Maria sabia que tinha ganho peso durante o tratamento, mas não quis discutir.
– Onde fica essa casa de campo? – perguntou ela.
– Muito perto de um lugar bonito, – sorriu Estêvão. – Acredito que vais gostar.
Maria decidiu não contestar. Ela também desejava um tempo para relaxar. “Talvez estejamos apenas cansados um do outro, – pensou. – Que sinta a minha falta. E eu não voltarei até que me peça.”
Ela começou a arrumar as suas coisas.
– Não estás chateada? – perguntou Estêvão. – É só por um período, para descansar.
– Não, está tudo bem, – forçou um sorriso Maria.
– Então, vou indo, – Estêvão deu-lhe um beijo na bochecha e saiu.
Maria suspirou pesadamente. Seus beijos tinham perdido há muito a antiga intimidade.
A estrada pareceu levar muito mais tempo do que o esperado. Maria perdeu-se duas vezes – o GPS estava a falhar e não havia sinal de telemóvel. Finalmente, apareceu uma placa com o nome da aldeia. O lugar parecia afastado, as casas eram de madeira, mas bem cuidadas, com bonitas molduras esculpidas.
“Claramente, não há confortos modernos por aqui”, – pensou Maria.
E ela estava certa. A casa era uma cabana meio em ruínas. Sem carro e sem telemóvel, sentir-se-ia como se estivesse no século passado. Maria pegou no seu telefone. “Vou telefonar-lhe”, – decidiu, mas o sinal continuava inexistente.
O sol estava a pôr-se e Maria estava cansada. Se não entrasse em casa, iria ter que dormir no carro.
Não queria voltar para a cidade, nem dar a Estêvão a razão de dizer que não estava a conseguir dar conta das coisas.
Desceu do carro. A sua jaqueta vermelha-brilhante parecia deslocada entre a paisagem rural. Sorriu para si mesma.
– Bem, Maria, não vamos desistir, – disse ela em voz alta.
De manhã, um grito estridente de galo a acordou, enquanto ela ainda estava a dormir no carro.
– Que barulho é este? – resmungou Maria, descendo a janela.
O galo olhou para ela com um olho e continuou a gritar.
– Que é que te passou, pá? – indignou-se Maria, mas nesse momento viu uma vassoura a passar à janela e o galo calou-se.
Na entrada apareceu um homem idoso.
– Bom dia! – cumprimentou ele.
Maria observou-o com surpresa. Figuras assim parecem já não existir – como se tivesse saído de um conto.
– Não fiquem chateados com o nosso galo, – disse o velhote. – Ele é bom, mas grita como se o estivessem a matar.
Maria riu-se, a sonolência dissipou-se instantaneamente. O homem idoso também sorriu.
– Ficas muito tempo connosco ou é apenas uma visita?
– Venho de férias, quanto conseguir aguentar, – respondeu Maria.
– Entra, miúda. Vamos ter um bom pequeno-almoço. Conheces a minha esposa? Ela faz bolos… Mas não têm quem venha comer. Os netos só aparecem uma vez por ano, os filhos também…
Maria aceitou. Era importante conhecer os vizinhos.
A esposa do Pedro era a verdadeira avó de conto de fadas – com avental, lenço na cabeça, um sorriso sem dentes e rugas bondosas. A casa estava cheia de limpeza e conforto.
– Que lugar maravilhoso vocês têm! – exclamou Maria. – Por que será que os filhos vêm tão raramente?
Ana acenou com a mão.
– Nós próprios pedimos para não virem. Não há estradas. Depois da chuva, é impossível sair por uma semana. Antigamente havia uma ponte, mesmo velha. Mas desabou há cerca de cinco anos. Vivemos como eremitas. Uma vez por semana, o Pedro vai ao mercado. O barco não aguenta. O Pedro é forte, mas a idade…
– Que bolinhos divinos! – elogiou Maria. – Não há ninguém que se importe com as pessoas? Alguém deve fazer algo.
– Pois, e quem somos nós? Apenas cinquenta pessoas aqui. Antigamente viviam mil. Agora já se foram.
Maria ponderou.
– Estranho. E a administração?
– Do outro lado da ponte. Para contornar, são 60 quilômetros. Achas que não tentamos ir até lá? A resposta é uma: não há dinheiro.
Maria percebeu que tinha encontrado uma ocupação para as suas férias.
– Diga-me onde posso encontrar a administração. Ou querem vir comigo? Hoje não vai chover.
Os velhinhos trocaram olhares.
– Estás a falar a sério? Vieste de férias.
– Estou completamente a falar a sério. As férias podem ser diferentes. E se eu voltar e estiver chuva? Quero fazer algo por mim também.
Os velhinhos sorriram calorosamente.
Na administração municipal disseram-lhe:
– Já chega de perturbar! Estão a fazer de nós vilões. Olhem para as estradas da cidade! Quem, na sua opinião, vai gastar dinheiro numa ponte para uma aldeia com meia centena de moradores? Procurem um patrocinador. Por exemplo, o Scolóvsky. Conhecem-no?
Maria acenou. Claro que conhecia – esse Scolóvsky era o proprietário da empresa onde trabalhava o seu marido. Ele era natural daqui, os pais mudaram-se para a cidade quando ele tinha cerca de dez anos.
Depois de pensar a noite toda, Maria decidiu-se. Sabia o número de Scolóvsky – o marido tinha ligado várias vezes a partir do seu telefone. Decidiu não mencionar que Estêvão era seu marido, mas ligar como uma pessoa externa.
Na primeira tentativa não teve sucesso, na segunda, Scolóvsky ouviu-a, ficou em silêncio, depois riu-se.
– Sabem, já me tinha esquecido de onde sou. Como estão as coisas por lá?
Maria ficou contente.
– É muito bonito, calmo, as pessoas são maravilhosas. Vou enviar fotos e vídeos. Igor, percorri todas as instâncias – ninguém quer ajudar os velhinhos. Sobram apenas vocês.
– Vou pensar. Envie as fotos, quero lembrar-me de como era o lugar.
Maria passou dois dias a gravar vídeos e tirar fotos para Scolóvsky. As mensagens foram lidas, mas não teve resposta. Já tinha decidido que era tudo em vão quando Igor ligou:
– Maria, poderia vir ao escritório na Rua da Liberdade às três da tarde? E traga um plano preliminar dos trabalhos.
– Claro, obrigada, Igor!
– Sabem, é como voltar à infância. A vida é uma corrida – nunca há tempo para parar e sonhar.
– Entendo. Mas vocês devem vir pessoalmente. Amanhã estou lá, sem falta.
Assim que desligou, Maria percebeu: aquele era o escritório onde o seu marido trabalhava. Sorriu: ia ser uma surpresa divertida.
Chegou antes da hora marcada, restava ainda uma hora até a reunião. Após estacionar o carro, dirigiu-se para o gabinete do marido. Não havia ninguém na recepção. Entrou e ouviu vozes do lounge. Seguiu para lá. Encontrou Estêvão e a sua secretária.
Ao ver Maria, eles claramente ficaram atrapalhados. Ela parou na porta, enquanto Estêvão saltou, tentando vestir as calças.
– Maria, o que estás aqui a fazer?
Maria correu para fora do gabinete, e no corredor esbarrou-se com Igor, que a quem entregou os documentos e, sem conter as lágrimas, correu para a saída. Não se lembrava como chegou à aldeia. Deitou-se na cama e desatou a chorar.
Na manhã seguinte, uma batida na porta acordou-a. Na entrada estava Igor com um grupo de pessoas.
– Bom dia, Maria. Vi que não estavas preparada para falar ontem, por isso vim eu. Poderás servir mais chá?
– Claro, entrem.
Igor não comentou nada sobre o dia anterior. Enquanto tomavam chá, quase todos os moradores da aldeia se reuniram na casa. Igor espreitou pela janela.
– Uau, uma delegação! Maria, será que não é o avô Ivo?
Maria sorriu: – Esse mesmo.
– Há trinta anos, ele já era avô e a sua esposa alimentava-nos com bolos.
O homem olhou preocupado para Maria, e ela respondeu rapidamente: – Ana está viva e a fazer os seus famosos bolos.
O dia passou em cuidados. As pessoas que Igor trouxe mediram, anotaram, calcularam.
– Maria, posso fazer uma pergunta? – dirigiu-se Igor. – Sobre o teu marido… Você vai perdoá-lo?
Maria ponderou, depois sorriu: – Não. Sabes, até estou grata a ele por tudo ter ocorrido assim… E depois?
Igor ficou em silêncio. Maria levantou-se, observou a casa: – Se a ponte for construída, este lugar pode se tornar maravilhoso! Reparem as casas, podemos criar espaços para lazer. A natureza é intocada, verdadeira. Mas não há quem o faça. E se você não quisesse voltar à cidade…
Igor a admirou. A mulher era especial, decisiva, inteligente. Ele nunca tinha percebido, mas agora via-a na sua plenitude.
– Maria, posso voltar aqui outra vez?
Ela olhou-o atentamente: – Vem, ficarei feliz em receber-te.
A construção da ponte começou rapidamente. Os moradores agradeciam a Maria, os jovens estavam a voltar. Igor tornou-se um visitante frequente.
O marido ligou várias vezes, mas Maria ignorou as chamadas e depois bloqueou o número.
Cedo de manhã, houve uma batida na porta. Acordada e sonolenta, Maria abriu a porta, esperando o pior, mas encontrou Estêvão.
– Olá, Maria. Estou aqui por ti. Chega de estar chateada. Desculpa, – disse ele.
Maria riu-se: – “Desculpa”? É só isso?
– Bem, não te zangues… Prepara-te, vamos para casa. Não vais expulsar-me, pois não? E, além disso, a casa não é tua, não te esqueceste?
– Agora vou mesmo expulsar-te! – exclamou Maria.
A porta rangeu e da sala saiu Igor, vestido de casa: – Esta casa foi comprada com o dinheiro da minha empresa. Ou achas, Estêvão, que sou um tolo? Agora, estamos em auditoria no escritório e vais ter que responder a muitas perguntas. E peço a Maria que não se preocupe – não é bom para a sua condição…
Os olhos de Estêvão arregalaram-se. Igor abraçou Maria: – Ela é minha noiva. Por favor, saiam da casa. Os documentos para o divórcio já foram apresentados, esperem pela notificação.
A cerimónia de casamento foi celebrada na aldeia. Igor confessou que aprendeu a amar o lugar novamente. A ponte foi construída, a estrada foi reparada e uma mercearia foi aberta. As pessoas começaram a comprar casas como segundas residências. Maria e Igor decidiram também reformar a sua casa – para que tivessem um lugar onde ir, quando tivessem filhos.
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