Minha irmã não hesitou em me pôr na rua.

Para mim, a minha irmã Inês sempre foi a pessoa mais importante do mundo. Depois da morte dos nossos pais, prometemos que iríamos sempre ajudar-nos uma à outra, não importava o quê.

Quando o meu filho ficou adulto, mudou-se para Lisboa, e eu fiquei no Porto. Pouco depois, o meu marido e eu divorciámo-nos, e fiquei sem casa.

Foi então que a Inês me deixou ficar no apartamento dela. Ela quase nunca estava em casa, sempre a viajar para fora.

Como eu trabalhava na empresa do meu ex-marido, fiquei não só sem teto, mas também sem emprego. A vida apertou—primeiro vivi das minhas poupanças, depois arranjei trabalho como empregada doméstica. Nessa altura, já vivia na casa da Inês há mais de dois anos.

Até que um dia, a minha irmã anunciou que eu tinha de sair do apartamento em breve porque ela ia alugá-lo. Já até tinha falado com uma agente imobiliária.

Não sabia o que dizer. A única coisa que me saiu foi um “Está bem.” Nesse momento, fiquei tão nervosa que quase não conseguia respirar. Tive de me acalmar e pensar: o que é que eu ia fazer? Para onde iria? Era um problema sério.

Quando a Inês chegou a casa, estava toda animada, a falar das contas da luz e da reunião que ia ter com a agente. Eu nem conseguia prestar atenção. Nessa mesma noite, ela partiu para a Madeira—quatro meses de férias, toda feliz. Normalmente, eu ficava contente em vê-la assim, mas desta vez não.

Só conseguia pensar numa coisa: onde é que eu ia arranjar casa? Um T0 no Porto custa os olhos da cara, e o meu salário só dava para um quarto num cortiço na periferia. Procurei ideias na minha cabeça, mas nada de jeito.

Um mês depois, tocaram à porta.

Apareceu uma desconhecida a dizer que era a agente da minha irmã e que eu tinha de sair imediatamente porque os inquilinos iam mudar-se naquela noite. Tentei explicar que não tinha para onde ir, que a Inês não me avisara. Mas ela nem quis ouvir. Tentei ligar à minha irmã, mas as horas não batiam—na Madeira, era de noite.

Agarrei as minhas coisas e saí. Passei essa noite num banco de jardim. De manhã, recebi uma mensagem da Inês: “Querida, desculpa ter acabado assim. Acredito que já tenhas arranjado um sítio para ficar.”

Aquela mensagem partiu-me o coração em mil pedaços. Como é que ela me podia fazer isto? Era a minha própria irmã!

Percebia que ela precisava do dinheiro, mas não conseguia entender por que razão me deixou nesta situação, sem aviso?

Doía-me perceber que o dinheiro agora valia mais do que a família.

Consegui alugar um quarto minúsculo numa casa antiga nos arredores. Mais tarde, arranjei um trabalho melhor e as coisas aliviaram um pouco.

Agora, vivo no meu quartinho como uma ratazana, tentando não incomodar ninguém, para não voltar a ficar sem teto.

O que mais me magoava era a Inês nunca ter pedido desculpa.

Depois, começou a ligar, a perguntar como eu estava. Mas agora já não há espaço para ela no meu coração, e limito-me a dizer que estou tão bem como qualquer outra pessoa.

Esta é a carta de uma leitora do Porto. Nas suas palavras, não há raiva, apenas um lembrete para cuidarmos daqueles que amamos. É óbvio que ela guarda mágoa, mas quando há um pedido de desculpas sincero, o coração humano é capaz de perdoar tudo.

Pense nisto—se calhar, sem querer, magoou alguém. Talvez seja a hora certa para pedir perdão.


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