Nada se resolve de uma só vez, tudo deve ser feito devagar… Preparar-se para não perder metade do que se conquistou.
Eu estava voltando para casa, com uma pequena caixa na bolsa. Dentro dela estavam os relógios para o meu marido, o Miguel – elegantes, caros, escolhidos com muito carinho.
Durante meses, guardei uma parte do meu salário a cada mês, para lhe fazer um presente especial.
Amanhã é o aniversário dele. Quarenta e dois anos – um número nada redondo, mas eu queria tornar esse dia memorável. Estamos juntos há quinze anos.
Lembro-me de como nos conhecemos na festa de um amigo em comum, como começamos a conversar e fomos embora apenas quando a noite já estava bem avançada.
O elevador do nosso prédio sempre foi temperamental. Antigo, ainda da época do regime militar, com paredes de compensado cobertas de graffitis.
Eu apertei o botão do elevador. A cabine descia lentamente, rangendo como se estivesse sustentando um peso insuportável.
Finalmente, as portas se abriram. A luz interna piscou. Entrei e apertei o botão desgastado com o número “8”.
As portas se fecharam, e o elevador começou a subir lentamente.
Imaginava como seria passar o dia todo com o Miguel. À noite, os amigos e os pais se reuniriam.
De repente, o elevador deu um tranco e parou.
Apertei novamente o número oito. Depois tentei outros botões. Nada.
– Só isso que faltava! – murmurei, suspirando. – Que azar.
Apertei o botão de emergência. Do alto-falante, surgiu um chiado, seguido por uma voz feminina jovem:
– Central, fala.
– Estou presa no elevador entre o primeiro e o segundo andares.
– Já avisei o técnico. Aguarde, em breve chegará ajuda.
– Mas quando exatamente? – perguntei, mas a resposta foi apenas o silêncio. A ligação caiu.
Tirei o telefone. O sinal estava fraco – uma única barra.
Tentei ligar para o Miguel, mas ele não atendeu. Provavelmente estava em uma reunião ou no metrô. Normalmente, nessa hora, ele já estava voltando para casa.
Passaram cerca de vinte minutos. Estava agachada, encostada na parede do elevador.
A bateria do telefone estava quase acabando, decidi desligá-lo.
De repente, ouvi vozes do lado de fora.
Uma voz feminina, aguda, com um leve raspado.
Era a Bruna, a vizinha do segundo andar. Jovem, bonita, sempre de salto alto. Nos cumprimentávamos quando nos encontrávamos, mas não éramos próximas. Uma vez, ajudei-a a carregar as compras e ela me ofereceu um chá, mas isso foi só.
– Você prometeu! – dizia ela com veemência. – Quanto mais é preciso esperar? Não aguento mais!
Uma voz masculina respondeu algo, mas era muito baixo. Não consegui distinguir as palavras, apenas a entonação – defensiva, um pouco irritada.
– Suas promessas não valem nada! – Bruna continuou. – Não tenho mais forças para ouvir isso! Você é um adulto, mas se comporta como uma criança!
Fui incapaz de não escutar. Um conflito familiar?
Em outra situação, talvez me sentisse mal por ouvir, mas agora, por causa do tédio e da desesperança, me tornei uma testemunha involuntária de uma conversa alheia.
– O que você quer de mim, Bruna?
A voz masculina ficou mais alta, e eu congelei.
O timbre, a entonação… Poderia ser o Miguel?
Pressionei-me à porta do elevador. Não era possível.
O Miguel deveria estar no trabalho. Ou em casa. Mas definitivamente não na casa da vizinha.
– Eu quero que você finalmente conte a ela a verdade – a voz da Bruna tremia de indignação. – Você precisa se divorciar. Até quando isso vai continuar?
– Nada se resolve de uma vez, entenda – agora eu reconhecia a voz do meu marido. – É preciso preparar-se. Com o divórcio, eu perco metade do patrimônio: o apartamento, o carro, a casa de campo…
– E o nosso filho? Você ao menos pensou nele?
O mundo ao meu redor parecia girar, como se eu tivesse perdido o chão. Filho? O que ela estava dizendo?
– Ele está prestes a completar um ano – continuou Bruna com uma clara reprovação na voz. – Ele vê o pai somente aos fins de semana, e mesmo assim não sempre. Como você pode se chamar de pai se nunca está por perto?
Queria gritar, bater a porta do elevador com todas as minhas forças. Queria berrar que estava ouvindo cada palavra. Mas meu corpo parecia paralisado, sem querer obedecer.
Eu congelei, como se tivesse caído em um abismo congelante. Mil pensamentos, lembranças, perguntas borbulhavam em minha mente.
– Espere só mais um pouco – a voz do Miguel soou cansada e vazia. – Eu já pensei em tudo. Logo tudo se resolverá.
– O que exatamente você planejou? – a Bruna respondeu com um riso cético. – Você sempre diz a mesma coisa. Sempre tem uma desculpa.
– Comecei a transferir dinheiro para outra conta – ele respondeu em um tom de quem fala sobre negócios. – Coloquei o carro no nome do meu irmão. Logo direi que vou a uma viagem a trabalho, e então pedirei o divórcio. Assim será mais fácil para todos.
– Por que não agora? – Na voz dela havia uma clara desconfiança.
Sentei-me lentamente no chão do elevador, segurando a caixa dos relógios com tanta força que pensei que isso me impediria de cair no abismo.
Os pensamentos se confundiam, colidindo e se rompendo um após o outro. Como isso aconteceu? Quando? Éramos tão felizes! Até mesmo planejávamos construir um banheiro novo na casa de campo naquele verão.
O Miguel sempre foi tão atencioso, tão cuidadoso. Será que tudo isso não passava de uma máscara?
Então lembraram-se das palavras da minha mãe. Antes do casamento, ela pegou minhas mãos e disse:
“O Miguel é um homem que chama a atenção. Atrás dele sempre haverá um monte de mulheres. Tenha cuidado para que ele não arruine o seu casamento”.
Na época, eu apenas ri. O aviso dela me pareceu engraçado e fora de lugar.
Como eu estava enganada…
As vozes do lado de fora silenciaram. Parecia que todo aquele grande prédio havia mergulhado em um silêncio absoluto, deixando-me sozinha.
Na minha cabeça, mil perguntas se aglomeravam: há quanto tempo isso começou? Os outros vizinhos sabem? E o mais importante – o que eu faço agora?
Se Miguel pensava em agir assim comigo, eu daria o primeiro passo antes dele. Decidi desmascará-lo no próprio aniversário dele. Que ele saiba o preço da sua mentira.
Após alguns minutos, alguém bateu a porta do elevador.
– Ei, tem alguém aí? – ouvi uma voz masculina.
– Sim, estou aqui! – respondi, com dificuldade me levantando. Minhas pernas formigavam por ter ficado agachada tanto tempo.
– Já vou abrir, não se preocupe!
Ouvi o barulho de ferramentas, e em alguns minutos a porta do elevador finalmente se abriu.
No hall, havia um técnico idoso, vestindo um macacão azul com o emblema da administradora do prédio. Cabelos grisalhos, rosto enrugado, mãos ásperas.
– Aqui estamos – ele sorriu – liberdade! Quanto tempo você ficou presa?
– Não sei ao certo. Meu telefone descarregou e não tenho relógio – respondi enquanto saía do elevador.
Me estiquei aliviada, sentindo a tensão abandonar meu corpo.
– Esses elevadores antigos não servem para nada – suspirou o técnico. – Mas ninguém se apressa para trocá-los. Dizem que não há dinheiro.
Assenti, agradeci e lentamente subi as escadas até o oitavo andar.
Abri a porta do apartamento. O Miguel já estava em casa, sentado na sala com um laptop no colo. Seus óculos escorregavam para a ponta do nariz, e o cabelo estava bagunçado – ele sempre faz isso quando está concentrado.
– Oh, você voltou! – ele sorriu com seu sorriso acolhedor. – Eu te liguei, mas você não atendeu.
– Fiquei presa no elevador – respondi, tentando que minha voz soasse normal. – Meu celular quase descarregou.
– Esse elevador de novo – Miguel balançou a cabeça. – Precisamos fazer uma reclamação. Quanto mais isso vai durar?
Olhava para ele, sem entender como ele conseguia mentir tão habilidosamente. Cada gesto, cada entonação agora pareciam falsos, artificiais.
– Você vai jantar? – perguntei, indo em direção à cozinha. – Vou fazer massa.
– Com certeza – respondeu ele. – Posso ajudar?
– Não, dou conta – dispensei e comecei a tirar os ingredientes da geladeira.
A noite passou como de costume. Jantamos, discutimos as notícias, assistimos a uma série. Miguel falava dos problemas do trabalho, eu ouvia com atenção, concordava e ria das piadas dele.
E dentro de mim, meu plano amadurecia.
Na manhã seguinte, comecei com um tom de voz exageradamente alegre:
– Feliz aniversário, meu amor!
Miguel abriu os olhos, se espreguiçou e sorriu.
– Obrigado, querida.
– Tenho uma surpresa pra você – sorri de forma misteriosa. – Mas primeiro você tem que fechar os olhos.
– O que você está planejando?
– Você vai ver – tirei da gaveta a gravata azul-escura dele. – Vire-se, vou amarrar os seus olhos.
Miguel se virou obedientemente. Amarre sumiu nos seus olhos, para que não pudesse ver nada.
– Para onde você me leva? – ele perguntou quando o levei para fora do apartamento.
Na sua voz, havia curiosidade e um leve nervosismo.
– Espero que não seja um salto de paraquedas! Você sabe que tenho medo de altura.
– Logo você saberá – respondi, conduzindo-o até o elevador. – Apenas confie em mim.
Descemos até o segundo andar. Saímos do elevador e o trouxe até a porta do apartamento da Bruna.
Eu apertei o botão da campainha.
Cada segundo de espera parecia uma eternidade.
Imaginava a cena: a porta se abrindo e o choque na expressão de Bruna. Eu a via completamente confusa.
Finalmente a porta se abriu. Na entrada, estava a vizinha usando um roupão, com uma toalha em cabelos ainda molhados. Sua expressão era de leve perplexidade.
— Leva ele embora — disse eu, dando um leve empurrão no Miguel para frente.
— O que? — Bruna olhava para nós com um claro sinal de confusão.
Fui puxando meu marido para dentro do apartamento. Ele ainda não entendia nada, mas ia me seguindo.
— Pode tirar a venda — disse eu confiante.
Miguel retirou a gravata dos olhos, piscou e começou a olhar ao redor.
— Onde estamos? O que está acontecendo? — ele olhava de mim para a Bruna, claramente sem reconhecer o lugar. — De quem é esse apartamento?
Cruzei os braços, pronta para o desenlace.
— Pergunte pra sua Bruna — lancei friamente.
Miguel encarou a vizinha com um semblante tão genuinamente perplexo que, por um momento, eu comecei a duvidar.
— Que história é essa? — ele olhava de um para o outro, confuso. — Vika, por favor, explica.
Bruna, também confusa, franziu a testa.
— Que conversa é essa? Ontem eu trabalhei o dia todo. Voltei só às nove da noite. Tive meu turno na loja até às oito.
Abri a boca para responder, mas aí um homem saiu da cozinha.
Nos braços, ele carregava um garotinho, que mordiscava um biscoito com gosto.
— O que está acontecendo aqui? — ele perguntou, e eu congelei.
Sua voz… aquele timbre, aquelas entonações… quase uma cópia exata da voz do Miguel. Até a maneira de falar parecia familiar.
Fiquei quente. O homem não se parecia com o Miguel, mas suas vozes… eram praticamente idênticas.
Eu ri, segurei a mão do Miguel e o puxei para fora.
— Desculpe, por favor — falei para a vizinha. — Isso é um mal-entendido. Já estamos indo.
Em casa, contei ao meu marido toda a história. Miguel ouviu com interesse, como se estivesse assistindo ao enredo de um filme.
Depois, balançou a cabeça e me abraçou.
— Vika, como você pôde pensar que sou capaz de tal coisa? Depois de quinze anos juntos? Você sabe o quanto eu te amo.
— Você acreditaria se estivesse na minha situação — sorri. — Desculpe pelo espetáculo.
— Sem problemas — Miguel retribuiu o sorriso. — Agora temos uma história engraçada para as noites de família.
Finalmente, tirei a caixa da bolsa e a estendi a ele.
Miguel ficou encantado com o presente, colocou os relógios imediatamente e passou o dia admirando-os.
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